Paixão pela paixão
O apaixonado entra no mar
sozinho, cego ao objeto, que,
esquecido entre as pedras, espreita-o.
A onda incita o prazer.
A espuma ameniza o desassossego.
A suposta metade, deitada na pedra,
sucumbe ao calor, enquanto ele
brinca na água como um garoto.
Ao seu coração entusiasta
o espelho cristalino basta.
Imiscível, a paixão prescinde do outro.
Todos natumba com.Bukowski
Charles, ninguém se importa com você.
Seu poema não importa.
Nem a lama nos sapatos do jovem
que acaba de fugir de casa e
tem nas mãos um pássaro
com a perna quebrada.
Observo da janela da sala:
ninguém se importa com eles.
Você não sabia?
A cerveja que busco na geladeira, derramo-a
em dois copos e, solitária, brindo ao amor.
Que importa se os transeuntes
deixaram os olhos em casa?
Aqueles eles
Porque aparecem como alazões
de crinas douradas
atraindo o olhar de amazonas ávidas,
acreditamos neles.
Porque batem à porta como cãezinhos
esfomeados
lambendo os pés de mães e filhas,
acreditamos neles.
Porque adentram nossa casa
como ursos pelosos
afastando o inverno da solidão,
acreditamos neles.
Quando deles emerge o monstro
de gigantescas patas que nos violenta
o corpo e a humanidade,
ninguém acredita em nós.
Guernica
Há um quê de desumano em meu abraço
Não percebe?
Possuo destroços em lugar de órgãos
infortúnios de um tempo sem pecado
o traço de Picasso na face
e nas extremidades pequenas avarias
Creia:
houvesse algo entre nós, desmoronaria
Os sapotis
No meio do caminho de minha infância,
na Rua do Lima, tinha
duas pedras parentais, que, mais tarde,
escondi no bolso do vestido.
Tinha um ser indecifrável,
com várias identidades: moço,
guarda, homem do saco, cuja
chegada próxima era sempre procrastinada.
Tinha a escola, uma casa pequena
para abrigar tanto céu e tanto inferno
trazidos nas mochilas das crianças.
E tinha as carambolas e
os sapotis que exterminavam
medos e colocavam sonhos
em seu lugar.
Os sapotis nefelibatas me ensinaram a escrever poemas...
Poemas lindíssimos, parabéns!
Belíssimos poemas, Noelia. Parabéns!